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série, show, musicais, exposição e discos marcam os 80 anos de nascimento do Rei do rock brasileiro


Da morte até os dias de hoje, passaram-se quase 36 anos. Um tempo ao longo do qual o baiano Raul Santos Seixas se tornou, mais do que o Rei do Rock Brasileiro, um estandarte da MPB. Raul, aliás, faria 80 anos neste sábado (28).

Largamente regravado e cultuado, o artista que o público costuma identificar com os personagens de suas canções — o Maluco Beleza, a Metamorfose Ambulante, a Mosca na Sopa, o Cowboy Fora da Lei — chegaria aos 80 anos neste sábado com uma “vitalidade” invejável: celebrado em série ficcional no streaming, em show do Baú do Raul, em exposição no Museu da Imagem e do Som de São Pauloem lançamentos, relançamentos, em musicais… coisa para deixar contente até mesmo aquele Raul que, na música “Ouro de tolo”, dizia recusar-se a sentar “no trono de um apartamento, com a boca escancarada, cheia de dentes, esperando a morte chegar”.

A festa começa esta quinta-feira, com a liberação dos oito episódios de “Raul Seixas: eu sou”, série Original Globoplay produzida pela O2 Filmes e dirigida por Paulo Morelli, um dos fundadores da O2. Gravada em 2023, ela começou como “Metamorfose ambulante” e virou “Eu sou” (algo que, segundo Paulo, Raul diz “dezenas de vezes” em suas músicas, além de ser um título “curtinho, mas que dialoga com essa metamorfose que ele era”). O nome perfeito para batizar um trabalho nascido de muita paixão e pesquisa.

— Entrevistamos mais de 20 pessoas para tentar entender quem era essa pessoa. Até que me deparei com a entrevista em que Raul dizia: “Eu sou um ator tão bom que eu finjo que sou cantor e poeta e todo mundo acredita.” Ou seja, ele era um criador de personagens. Esse se tornou o núcleo dramático, a história de um criador e uma criatura — explica o diretor. — O criador é o Raulzito, tímido. Ele cria o personagem Raul Seixas para poder se projetar, para poder realizar os seus sonhos. E essa criatura que surge, esse Raul Seixas é um radical, numa época radical. Ele pisa no acelerador e não volta atrás, ao ponto de a criatura matar e, ao mesmo tempo, imortalizar o criador.

O compromisso de Morelli em “Eu sou” foi “o de transformar em imagem os sonhos do Raul” (que envolviam discos voadores e até a figura de Dom Quixote). E um de seus trunfos foi Ravel Andrade, de 33 anos, que, “além de ser um grande ator, é um grande músico e tem o corpo parecido com o do Raul”.

Foi mesmo coisa do destino: Ravel chegara a ser cogitado para o papel do Raul adolescente quando o irmão, Júlio Andrade, viveu o baiano na série “Por toda minha vida”, da Globo, em 2009. Ele mesmo acabou vivendo depois o jovem Paulo Coelho quando o irmão interpretou o escritor, grande parceiro de Raul, no filme “Não pare na pista” (2014). Em “Eu sou”, Júlio faz uma ponta como o pai do cantor, Raul Varella Seixas.

— Raul tirou de dentro de mim toda essa irreverência que eu nem sabia que tinha. E eu exercitava isso o tempo todo: na minha casa, nos ensaios com os outros atores, no set, quando estava fora de cena… — conta Ravel.

Nascido dois anos após a morte do cantor, Ravel conta que, até antes da série, o que rondava a sua cabeça era a lenda, “essas histórias mirabolantes do Raul, do encontro com John Lennon, essas viagens que a gente não sabe o que é verdade e o que é criação”. Um personagem até, de certa forma, caricato.

— Quando comecei a me aprofundar nele, vi como Raul é realmente uma metamorfose ambulante e o quanto ele sempre foi atrás da autenticidade. Alguém plantava uma semente na cabeça dele e ele ia fundo nessa história — acredita. — Mas o que me surpreendeu nessa pesquisa foi descobrir o Raul produtor musical, que desconhecia completamente. Esse cara criterioso com a música, criterioso com os arranjos, um cara muito inteligente musicalmente. E também esse Raul introspectivo de dentro de casa, tímido, amoroso e silencioso.

Raul Seixas — Foto: José Vidal / Agência O Globo
Raul Seixas — Foto: José Vidal / Agência O Globo

A música ganhou fundamental importância em “Eu sou”. Quase 50 canções de Raul entram na série, na íntegra ou em trechos, e o roteiro se preocupa até em contar como foram compostas algumas delas (em especial, “Al Capone” e “Gîta”). Para a direção musical, Paulo Morelli convocou o renomado produtor Kassin.

— Muito da dramaturgia acontecia em shows ou ensaios, e a gente tinha que achar uma voz mais próxima possível da do Raul. E aí, abriu-se um concurso (de imitadores) para o Brasil, quase 200 pessoas se inscreveram — diz Kassin.

Do concurso, veio o maranhense Tony Gambel, cantor que engambelou inclusive Rick Ferreira (guitarra), Paulo César Barros (baixo) e Ivan Mamão Conti (bateria, que morreu logo após as gravações), músicos dos fonogramas clássicos de Raul, que se reuniram pela primeira vez em décadas, para gravar a trilha de “Eu sou”. Ao resultado, adicionou-se em partes a voz de Ravel Andrade, segundo Kassin, “para não perder o calor da performance”.

Morelli conta que cuidou de ressaltar a presença feminina na história desse baiano casado cinco vezes, pai de três filhas e que teve na mãe, Maria Eugênia, um porto seguro:

— Sempre que Raul ficava mal, ele voltava para Salvador, literalmente, para o colo da mãe. A gente tentou equilibrar esse lado mais íntimo, familiar, com o lado musical, o lado político e o lado místico, que Paulo Coelho trouxe. No fim das contas, foi melhor ter feito uma série (que um filme). Com uma vida tão rica, tão cheia de aspectos para mergulhar, se fosse um longa, a gente teria que fazer um recorte muito mais preciso.

Vivi Seixas e Kika Seixas, filha e ex-mulher de Raul Seixas — Foto: Divulgação
Vivi Seixas e Kika Seixas, filha e ex-mulher de Raul Seixas — Foto: Divulgação

Duas mulheres, por sinal, estão à frente do Baú do Raul 80 anos, uma festa-show no sábado, no Circo Voador, no Rio, com as participações de Frejat, Paulinho Moska, Rick Ferreira, Arnaldo Brandão, Baia, Ana Cañas, Clariana, André Prando, BNegão, Thathi, Putos Brothers Band e Emílio Dantas. Terceira esposa de Raul e mãe de sua filha mais nova, Vivi, Kika Seixas lembra de quando o Baú nasceu, em 1992, no mesmo Circo para o qual retorna:

— Era só uma banda desconhecida, chamada Metamorfose Ambulante, e os artistas. Quando cheguei, a fila ia até depois dos Arcos da Lapa. Eu falei: “Meu Deus do Céu!” Foi ali que começou isso, essa coisa espontânea dos fãs do Raul, não havia nem divulgação.

Já Vivi celebra que “nunca houve tanta mulher quanto nesse Baú”.

— Acho que esse negócio do rock’n’roll é sempre associado a homens, motos e jaquetas. Sinto falta de mulherada também representando — diz Vivi, DJ, que em setembro, no Rio, no festival Doce Maravilha, apresentará o projeto audiovisual “Rock das aranhas live”, com a também DJ Paula Chalup e o VJ Spetto. — Remasterizamos e remixamos gravações dele, inclusive sobras de estúdio em que ele está contando histórias, mexendo com outros músicos. E as projeções estão ficando incríveis!

Para Vivi, a garotada de hoje realmente se reconhece nas letras das músicas do pai:

— Não é uma coisa tipo “ai, o meu pai ouvia Raul”. As crianças adoram essa parte mais lúdica, de “Mosca na sopa”, “Carimbador maluco” e “Eu nasci há dez mil anos atrás”. Vejo a criançada dando risada no “quando a pedra despencou da ribanceira eu também quebrei a perna”. Mas aí, quando essa geração vai crescendo, vai entendendo que por trás dessas letras tem uma outra história — diz a filha.

O ator Bruce Gomlevsky em “Raul Seixas — O musical” — Foto: Divulgação/Dalton Valerio
O ator Bruce Gomlevsky em “Raul Seixas — O musical” — Foto: Divulgação/Dalton Valerio

Ainda no sábado, em São Paulo, acontece a 100ª apresentação de “Raul Seixas, o musical”, criado e estrelado pelo ator Bruce Gomlevsky (famoso por seu musical sobre Renato Russo, com o qual vem correndo o país há 18 anos). A sessão é no Teatro-D-Jaraguá, do Hotel Jaraguá, onde Raul chegou a viver nos anos 1980. O musical estreou em março do ano passado no Rio e saiu em turnê pelo Brasil. Ele volta à cidade dias 18 e 19 de julho, no Teatro Rival Petrobras.

— Raul é o Brasil de que a gente se orgulha, no meio desse caos que a gente vive — considera Bruce.

Para o fim de julho, está programado o lançamento, pela Universal Music, de um EP em homenagem a Raul, produzido por Rodrigo Suricato. Estarão lá o Maneva (com “Eu nasci há dez mil anos atrás”), BNegão (“Tente outra vez”), Ana Cañas (“Metamorfose ambulante”), Chico Chico (“Moleque maravilhoso”), Baia (“Gîta”) e o próprio Suricato, com “Cowboy fora da lei”. Só falta Rick Ferreira gravar sua parte.

— Raul foi a primeira vez em que entendi o que era a ironia numa letra, que você podia ter um deboche muito escancarado. E os arranjos do Raul eram todos muito simples, a complexidade estava muito mais nele próprio do que naquele instrumental todo — explica Suricato.

E a festa fonográfica para Raul se completa no vinil: sábado começa a pré-venda de um compacto, editado pelo selo Record Collector, com duas versões inéditas de “Cowboy fora da lei”. E ainda este ano a Universal Music Brasil relança em vinil os clássicos álbuns “Novo Aeon” (que em 2025 completa 50 anos) e “Gîta” (1974). Para o fim deste ano ou ano que vem, está prevista ainda a estreia de “Raul Seixas, uma Ópera Rock Brasiliana”, com direção musical de Russo Passapusso e direção artística de Batman Zavareze, unindo o BaianaSystem à Orquestra Afrosinfônica.



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