É possível que você ainda não tenha ouvido falar em Giovana Cordeiro, a jovem atriz que brilhou como a lutadora de kickboxing Bárbara na primeira fase da novela das sete, “Dona de mim”. Mas o obstetra que fez seu parto, em 1996, já sabia que ela seria um sucesso. “Pronta para fazer uma novela da Globo”, brincou, naquele 16 de novembro, entregando à mãe o maior bebê da maternidade do Hospital Naval Marcílio Dias, no Lins de Vasconcelos, na Zona Norte do Rio: 51 centímetros e quase quatro quilos. “Foi um presságio”, vibra a carioca criada no Recreio dos Bandeirantes, Zona Oeste da cidade.
Sinal do destino ou não, Giovana, de 28 anos, é hoje uma das principais expoentes da nova geração de atores da emissora. Estreou na TV em 2017, na minissérie “Dois irmãos”, e ganhou papéis de destaque em “Rock story”, “O outro lado do paraíso” e “Mar do Sertão”, onde contracenou com nomes do quilate de Enrique Díaz. “Fui muito feliz em nossos encontros. É uma atriz sensível, dedicada e super-honesta no trabalho”, elogia o ator veterano.
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Em 2023, a atriz viveu sua primeira protagonista e, neste ano, foi escalada para uma participação na trama das sete. Fez tanto sucesso que, segundo sua assessoria de imprensa, ela volta a gravar como a lutadora no próximo dia 27 de julho. “Amei escrever para ela e ver o resultado na tela. É uma estrela, tem um magnetismo absurdo, um talento imenso e uma entrega maravilhosa”, elogia a autora Rosane Svartman. Enquanto aguarda questões contratuais, Giovana continua a rotina de aulas de luta. “Fiz karatê durante a infância e a adolescência, mas nunca tinha feito kickboxing, foi uma preparação intensa.”
Todos os dias, Giovana acorda às 5h para fazer exercícios e tem cuidado melhor da saúde com a ajuda de um nutricionista e um endocrinologista. “Percebi o quanto a alimentação, a reposição de vitamina e esse entendimento do equilíbrio hormonal são fundamentais para nós, mulheres. Meu desenvolvimento físico mudou muito com essa combinação”, diz ela, que relata ter tido certa insegurança com o próprio corpo durante a adolescência. “Eu era muito magra, e tinha vergonha disso. Às vezes, vestia duas calças e, com 16 anos, fiz a loucura de usar anabolizante por uns 15 dias. Não cheguei a completar o ciclo de uso da substância, fiquei com medo porque passei a ter dores no estômago. Hoje, levo minha vida com muito mais leveza e cuidado.”
Leve, sim, passiva jamais. Embora não aconselhe ninguém a reagir a assaltos ou provocações, a atriz já saiu na mão com um homem que ameaçou a paz de um momento descontraído com uma de suas irmãs, em 2016. “Ele achou que estava tarde demais para duas mulheres beberem na rua e quis nos intimidar. Veio para cima com a mão na cintura simulando que tivesse uma arma, e, naquele momento, meu instinto foi de matar ou morrer. Levantei e dei um mata-leão nele no meio de uma praça do Recreio.”
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O episódio revela o instinto de proteção e do vínculo de Giovana com a família, especialmente com as duas irmãs, Daniela, de 30 anos, e Natália, de 33, que hoje trabalham com a atriz na organização de sua rotina, entre gravações e criação de conteúdo voltado para publicidade nas redes sociais. “Nunca houve competição entre nós, e essa era uma preocupação da minha mãe em torno da nossa criação. Ela sempre quis que nós três fôssemos amigas”, conta Giovana, filha de uma pedagoga com um empresário. Para ela, nenhum papel supera o de tia: “Ter sobrinhos fala um pouco sobre meu desejo de ser mãe, mas, definitivamente, não é algo para agora”.
A atriz faz parte de uma geração sem papas na língua, mas levou tempo para adquirir confiança a ponto de se impor em situações hostis com colegas de trabalho tóxicos. No início da carreira, viveu um episódio dolorido, que levou anos para elaborar. “Só entendi como tentativa de assédio depois. O sujeito ameaçou não me dar o trabalho se eu não fosse encontrá-lo. Falou que estava quase chamando outra pessoa”, recorda-se a atriz. O caso tornou Giovana mais vigilante e questionadora sobre cenas que envolvem nudez, principalmente por uma imagem sua em “Dois irmãos”, minissérie exibida em 2017, ter sido exposta num site que compila vídeos onde atrizes aparecem sem roupa nas gravações. “Entendi que, depois de lançar o meu corpo para o mundo a serviço da minha arte, perco o controle sobre ele. Então, preciso fazer escolhas que me preservem. Não quero saber se estou deixando o outro desconfortável, em primeiro lugar vem a minha integridade.”
Integridade e inteireza. Sem meias palavras, Giovana muda o tom para falar, pela primeira vez, sobre um estupro que sofreu aos 18 anos, ao voltar de um dia de gravação com um “colega”. “Ele havia me oferecido uma carona até meu endereço, aceitei e cochilei no carro. Acordei na garagem da casa dele. Fiquei muito assustada, tive medo de ser agredida em um lugar que não fazia ideia de onde era. Decidi ficar por achar que fosse mais ‘seguro’, e logo me deitei para dormir. Mas ele não me deixava cair no sono, ficou insistindo e fez sexo comigo sem o meu consentimento.”
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A atriz precisou de cinco anos para elaborar o episódio como abuso sexual e chegou até a desenvolver uma infecção de repetição de fundo emocional. “Era como se o meu corpo quisesse me punir ou me alertar para uma necessidade de cura de uma culpa que eu não tinha”, relata. Natália, a irmã mais velha, foi quem amparou a irmã. “Quando a Giovana relatou o que viveu, confesso que minha vontade foi de fazer um escândalo, ver o sujeito pagar pelo que fez. Mas, temos que respeitar o momento de quem viveu o abuso, e sabemos que, na prática, nem sempre a vítima é levada a sério. Estamos aqui por ela e com ela.”
Nascida numa família miscigenada, formada historicamente por brancos, negros e indígenas, Giovana, em 2023, gerou discussão nas redes sociais por se autodeclarar uma mulher branca durante a coletiva de imprensa da novela “Fuzuê”. “Nunca haviam questionado minha racialidade até aquele momento, e minha compreensão à época não considerava o termo pardo. Dei aquela declaração com incômodo, porque me senti pressionada a dar uma resposta, que acabou não sendo suficiente, apesar de coerente com o que eu sentia”, comenta Giovana, que diz reconhecer-se em sua mesticidade. “Depois da polêmica, ficou muito claro o lugar que ocupo, que é onde qualquer outra pessoa parda também está: há situações em que você é vista como negra, e outras, como branca. Isso permeia minha vida, vim de relações inter-raciais.”
E, por falar em relação, Giovana vive um novo momento no amor: está solteira após seis anos de namoro com o ator Giuliano Laffayette. “Cresci muito dentro desse relacionamento, ele me acompanhou em todas as minhas fases enquanto artista e nunca podou minhas asas. Mas, agora, acho que estou precisando curtir minha própria companhia. Confesso que tive medo da solidão”, comenta. Pensar na possibilidade de uma nova relação agora está longe de ser prioridade. “Minhas amigas já me deixaram ciente de que a pista está muito salgada para mulheres solteiras. Fiquei sabendo que a moda agora é ser ‘conversante’, que eles ficam de papo nas redes, mas nunca marcam encontros. Não tenho tempo nem paciência para isso”, conclui a atriz, segura da sua bissexualidade. “Acredito que hoje seja mais fácil ter uma relação com mulheres. Somos mais profundas e encaramos de frente as questões dentro de um relacionamento.”
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Não por acaso, nas fotos que acompanham esta matéria, Giovana veste a alfaiataria de ombros largos e as gravatas estilosas que compõem o chamado power dressing. A tendência ajudou mulheres a entrarem no mercado de trabalho há 50 anos e, hoje, volta com tudo entre a comunidade LGBTQIAP+, que segue lutando por seus direitos e reconhecimento (veja mais na página 34). Uma potência em todos os sentidos.